segunda-feira, janeiro 30, 2006

RX de uma canção - CENTÚRIAS

Chegou a hora de “Centúrias”.

Clique no título do post para ouvir uma versão ao vivo!

Essa é mais uma música em parceria com Fred Nascimento, originalmente composta pro CD solo dele em 1993, antes do “Tantra”. Como o CD solo acabou não saindo e ela não entrou no do Tantra, eu resolvi me apropriar da canção e desde então ela faz parte do repertório do ZERØ.

Chegamos a gravá-la pra constar no “Electro Acústico” (a versão está disponível no site em: “Entrar no site” > “Banda” > “Áudio ZERØ” - a esquerda embaixo da foto) produzida por JPMendonça em 2000, mas acabou perdendo o lugar para “Mentiras”.
Esse registro tem um solo magistral de Sérgio Serra, tão bacana que me faz pensar muito seriamente se eu vou regravá-la ou se a edito no “Quinto Elemento” tal como está.

Ela ganhou seu título pelo tom profético da letra e porque se configurou em quadras como as Centúrias de Michael de Notre Dame, o popular Nostradamus. Quando escrevi a letra eu não sabia o que sei hoje sobre a quarta dimensão e a consciência réptil e fiquei surpreso quando percebi que esse conhecimento se manifestava precoce e inconscientemente nessa canção.

Quem narra é o tempo, o fóssil vivo, o anjo profano. Ele avisa que não temos o tanto (de tempo) que pensamos. Ele tudo viu e tudo vê sobre o passado, presente e futuro, mas nada pode fazer a não ser lembrar que do jeito que vai, vai muito, muito mal.


Todos que a escutam me perguntam o que eu quero dizer com "O réptil anda atrás". Os répteis foram os primeiros habitantes da face seca da terra. Surgiram ao final do Pensilvaniano, no período Carbonífero da era Paleozóica, há estimados 320 milhões de anos. Abundaram no planeta por toda a era Mesosóica e foram extintos no período Cretáceo há uns 144 milhões de anos atrás. Ou seja, os lagartos crescidos com cérebro proporcionais ao tamanho de uma noz reinaram absolutos na terra por uns bons 160 milhões de anos. Podemos dizer que deles “evoluímos”?

Estamos por aqui há apenas 2 milhões de anos (surgimento do Homo sapiens/Homo erectus na cronologia mais usada) ou há 5 milhões de anos como apontam descobertas arqueológicas mais recentes. Nos reputamos o ápice da cadeia evolutiva, os seres mais inteligentes do planeta, mas quase acabamos com ele e pelo andar da carruagem, depois de termos eliminado muito de seus recursos naturais e de sua bio-diversidade, estamos caminhando aceleradamente pra nos auto-extinguirmos.

Se inteligência pode ser medida pelo sucesso de uma espécie, estamos muitas dezenas de milhões de anos distantes de podermos considerar-nos inteligentes.

Well... Findo o “Guilherme Isnard também é cultura”, essa canção é um alerta de que se não modificarmos a nossa visão sobre a natureza, a vida e o universo, estamos sob a ameaça de retornarmos ao nível da consciência réptil ou ainda de sermos extintos como eles.

CENTÚRIAS
© 2006 - Guilherme Isnard & Fred Nascimento (BMG Publishing)

Ando no escuro
Vejo o futuro
Sou celacanto
No fundo do mar

Anjo profano
Sono profundo
Falta um segundo
Pro mundo acabar

Confio no pai
Confio na mãe
Confio no espírito
Santo também

Confio no filho
Confio na luz
Confio nas trevas
Confio em ninguém...

A sangue-frio se inventa a bomba “H”
Mais violência em nome da paz
Sou do futuro e vim pra te avisar
Que o réptil anda atrás

Vivo no escuro
Na sombra do mundo
Anjo caído
No fundo do mar

Vejo o futuro
De cima do muro
Falta um segundo
Pro mundo acabar

A sangue-frio se inventa a bomba “H”
Mais violência em nome da paz
Sou do futuro e vim pra te avisar
Que o réptil anda atrás

Eu não sou Jesus
Esqueçam de mim
Me deixem que eu vou dormir em paz

Eu não sou Jesus
Me tirem da cruz
Eu juro que nunca vou voltar

Eu nunca vou voltar
O réptil anda atrás.


Clique no título do post para ouvir uma versão ao vivo!

sexta-feira, janeiro 27, 2006

RX de uma canção - PRA PODER DORMIR EM PAZ

Essa é uma canção (Clique no título do post para ouvir uma versão ao vivo!) que fala de uma espécie raríssima de ser humano e de sua absoluta imprescindibilidade: mulheres inconstantes.

A parceria que a originou, é igualmente rara. Meu camarada e guitar hero Sérgio Serra foi meu vizinho por uns seis anos no Jardim Botânico. Quando eu voltei a morar no Rio de Janeiro e vi o sorriso dele na janela do terceiro andar no prédio ao lado, a primeira coisa que pensei foi – Legal! Vamos fazer muitas músicas juntos!


Infelizmente tudo o que conseguimos compor cabe nos dedos de uma mão, mas como ambos estamos vivos e quicando quem é que pode saber o que ainda vem por aí.

Ele tinha esse dedilhado que lembrava Led Zeppelin, uma da nossas bandas prediletas e por isso “Pra Poder Dormir Em Paz” ganhou uma citação a “Stairway to Heaven” numa vocalização em falsete ao final, que emula a guitarra de Jimmy Page. Como ela e
ra uma doce balada, criamos uma segunda parte pesada pra encaixar um refrão mais agressivo.

Eu saí cantando palavras sem censura ou pudor. Como quase sempre, foi desse inconsciente verborrágico que a letra brotou. O primeiro verso dando a tônica da canção. A imprevisibilidade do feminino. A inconstância de seus humores. Suas alternâncias hormonais. Suas surpresas e seus múltiplos sabores. O refrão nasceu da necessidade de afirmar que na verdade esse temperamento lusco-fusco é o mistério que nos fascina e mesmeriza em uma mulher.

O twilight, o sentido fugidio, o que é dito entre as palavras, o sim que significa não e vice-versa é justamente o que carece da razão, incisão e decisão complementares masculina.


Antes um beijo roubado a boca armada do que nenhum beijo.
E aí o sono tranqüilo.

No mais, trata-se de uma letra auto-explicativa, se é que vocês me entendem...

PRA PODER DORMIR EM PAZ
© 2006 - Guilherme Isnard & Sérgio Serra (BMG Publishing)

Chega quando fica
Entra quando sai
Cala e comunica
Volta quando vai

Fala quando dorme
Chora quando ri
E o caos uniforme
Ronda por aqui

Ye-yeah!
Você é o alvo de um desejo
E o desejo é demais
Minha boca armada rouba um beijo
Pra poder dormir em paz

Você é o alvo de um desejo
E o desejo é demais
Minha boca armada rouba um beijo
Pra poder dormir em paz

Mapa picotado
Óbvio incomum
Anda para o lado
Pra lugar nenhum

Vale o quanto pensa
Não quer quando eu quis
Crime e recompensa
Dura como giz

Ye-ye-yeah!
Você é o alvo de um desejo
E o desejo é demais
Minha boca armada rouba um beijo
Pra poder dormir em paz

Você é o alvo de um desejo
E o desejo é demais
Minha boca armada rouba um beijo
Pra poder dormir em paz

Você é o alvo de um desejo
E o desejo é demais
Minha boca armada rouba um beijo
Pra poder dormir em paz

Você é o alvo de um desejo
E o desejo é demais
Minha boca armada rouba um beijo
Pra poder dormir em paz
Ah-ha, ah-ha

Pra poder dormir em paz
Ah-ha, ah-ha


Pra poder dormir em paz
Ah-ha, ah-ha

Pra poder dormir em paz
Ah-ha, ah-ha

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Alguém pode ajudar?

Esse sistema de comentários não publica o endereço de e-mail dos autores, embora exista o campo apropriados e a maioria preencha.

Alguém já usou esse sistema? Sabe como eu posso configurar isso de forma que os endereços de e-mail apareçam nos comentários? Eliminei o sistema de comentários do próprio Blogger por conta da enxurrada de “Spam comments”, eu posso com isso? Esses idiotas não respeitam mais nada.

Eu não prometo responder a todos, a tarefa é impossível – São 2700 @migos no Orkut, comunidades, e-mails de fãs, contatos através do site, blog... é muita coisa pra um cantor só que ainda tem de ensaiar, fazer shows, compor e escrever coisas interessantes pra fazer da visita de vocês uma experiência diariamente renovada – Mas se conseguir fazer aparecer os endereços de e-mails vez por outra poderei trocar diretamente com os comentaristas, principalmente aqueles que se mostrarem mais assíduos.

Grato pela ajuda,
Amor e Força!

segunda-feira, janeiro 23, 2006

RX de uma canção - CANÇÃO PROIBIDA

A pintura que ilustra esse post é o quadro "Amor Victorious" considerado uma das mais importantes obras primas de Caravaggio. O torso da figura emula "Victory" de Michelangelo e provavelmente representa a vitória triunfante do amor terreno sobre as virtudes e as ciências, aqui simbolizadas pelos instrumentos musicais, a pena e o livro, o compasso e o quadrado, o cetro, o diploma, e a armadura a seus pés.

“Canção Proibida” (Clique no título do post para ouvir uma versão ao vivo!) nasceu de um fragmento que o Yan e eu começamos a trabalhar num dos nossos encontros de composição.

Eu gostei de cara do riff da guitarra. Achei “mauzão”, bandido. Lembro que começamos a escrever uma letra naquele dia mesmo, mas essa foi outra canção que ficou ali por meses, latente e inconclusa, quase esquecida. Até que num ensaio o Yan me perguntou se eu tinha terminado a letra e mostrou o que a gente já tinha feito pra banda. Todos adoraram e fomos arranjando e escrevendo ao mesmo tempo até terminar o que resultou em um dos nossos temas mais pesados, um rock básico, com um riff de guitarra marcante e agressivo e um refrão melódico.

Sua letra tem como pano de fundo uma situação recorrente que eu encontro sempre que começo um novo namoro. Toda mulher sonha com uma canção feita pra ela. E todas invariavelmente chegam naquele momento em que não se contêm e perguntam quando é que eu vou escrever uma música sobre o nosso amor.

Minha resposta clássica e sincera é a de que eu escrevo lindas canções de separação ou despedida (isso fica muito claro no meu retrospecto) e elas emudecem. Mas é a mais pura verdade. É nos momentos de perda que eu faço contato com os meus sentimentos mais profundos. É na dor que eu me igualo a todos os que sofrem e aí consigo escrever canções que vibram no inconsciente coletivo.

Eu já me torturei muito tentando descobrir porque nunca escrevia canções alegres, principalmente depois de ouvir Caetano Veloso apontar como a maior qualidade de Jorge Benjor o fato dele nunca ter feito uma música triste. Na época fiquei preocupadíssimo e apaixonado que estava, tentei compor uma canção feliz. O Resultado foi “Em Volta Do Sol” do CD “ZERØ Electro Acústico” em parceria com o grande Dudu Caribe. Em seguida participei involuntariamente de uma outra parceria onde ela entrou com o pé e eu com a bunda.

Enfim, melhor deixar a alegria com o Benjor, ele sabe o que está fazendo. Eu fico com o que eu entendo, ou melhor, com o que me inspira e espero que a namorada compreenda.

Em “Canção Proibida” fica claro, ou nem tanto, o seguinte: Eu tinha terminado um relacionamento longo com uma mulher que ouviu a minha resposta clássica quando perguntou se eu não escreveria a “nossa” canção. Só que essa foi uma daquelas relações que terminam em paz, “de bem”, sem mágoa ou maiores sofrimentos. Somos excelentes amigos até hoje e ela sabe quanto eu a adoro.

A nossa não foi uma canção triste e por isso está “proibida”!

CANÇÃO PROIBIDA
© 2006 - Guilherme Isnard & Yan França (BMG Publishing)

Tem coisas que eu entendo
Nem leio o manual
Eu nunca me arrependo
Só não me leve a mal
Hey, hey! Na-na-não!
Não leve a mal!

O que eu não sei invento
Mentira casual
O tempo todo eu tento
O medo é irreal
Hey, hey! Na-na-não!
Não é real!

Você entrou na minha vida
Então eu fiz uma canção
Antecipando a despedida
Eu só não tinha uma razão

E a nossa canção...

Ficou proibida
Ninguém vai cantar
Marcou nossa vida
E não tem mais lugar

Canção proibida
Não vai mais tocar
Eu não vejo saída
E não posso voltar, não!

Quem sabe um dia aprendo
Que o amor é imortal
Vou me desenvolvendo
Voltar não é normal
Hey, hey, hey! Na-na-não!
Não é normal!

Você entrou na minha vida
Então eu fiz uma canção
Antecipando a despedida
Eu só não tinha uma razão

E a nossa canção...

Ficou proibida
Ninguém vai cantar
Marcou nossa vida
Não tem mais lugar

Canção proibida
Não vai mais tocar
Eu não vejo saída
E não posso voltar, não!

Canção proibida!
Na-não, não vai mais tocar
Canção proibida!
Na-na-não vai mais tocar
Canção proibida!
Na-não, não vai mais tocar
Canção proibida!
Na-na-na-na-na-não!

sexta-feira, janeiro 20, 2006

RX de uma canção - OS ANJOS DIZEM AMÉM

A principio essa música (Clique no título do post para ouvir uma versão ao vivo!) não era pra ter nada a ver comigo. Mas só a princípio, ainda bem.
Em 2002 hospedei em casa um amigo da minha querida Débora Nassuti. Um camarada talentoso que estava no Rio de Janeiro estudando cinema, mas que pretendia compor músicas. Esse amigo, Régis Rodrigues (AKA Régis Bittencourt ou Régis Trovão), escreve muito bem e por isso eu sugeri que ele procurasse um músico pra criar com ele.
O malandrinho foi procurar justo o cara que acabara de entrar no ZERØ e começaram a compor. Me senti meio que atropelado quando soube. Afinal, Yan França era o novo guitarrista da minha banda, a gente ainda não tinha tido a oportunidade de fazer nada juntos e lá estava ele compondo com outro cara. Ciúme é mesmo um sentimento ridículo, mas foi o que eu senti até ouvir a primeira canção dos dois e perceber que eu também tinha com o que contribuir.
Não por nada, nem que não estivesse bom, muito ao contrário. “Os Anjos Dizem Amém” - primeiro fruto da parceria - já continha todos os ingredientes de uma bela canção. Só estava desarrumada. Tinha sílabas e tempos melódicos sobrando, vocábulos que não fluíam e uma melodia que se desdobrava pra encaixar as muitas palavras alí enfileiradas.
Fernando Pessoa dizia que a canção é a poesia ajudada, eu não discordo. A letra de uma canção tem características totalmente diferentes da palavra dita, lida ou escrita. Na canção as palavras precisam ter musicalidade ou expressá-la na forma em que se encadeiam. O sentido e o som de cada uma delas precisam estar entrelaçados em um fluxo melódico contínuo. Era só isso que me incomodava no belo poema do meu amigo Régis. Não era uma letra de música, era um belo poema e eu podia "ajudar".
Eu nunca me considerei um poeta, nunca escrevi algo com essa pretensão, nem nada que fosse musicado depois de escrito. Apenas arrumava as palavras em torno de um desenho melódico. Cuidando para que fizessem sentido, que narrassem com clareza uma história ou depoimento. Mas por diversas vezes sacrifiquei trechos pouco fonéticos ou musicais de estrofes belíssimas. Ou seja, eu sou um letrista. Trabalho sim com as palavras e a sua poesia, mas com elas estou mais para artesão do que artista. Cheguei até a inventar a palavra “proesia” pra designar minha prosa poética, mas foi em vão como vocês verão.
Um belo dia estava eu explicando essa diferença entre o poeta e o letrista pra uma pessoa em um papo de messenger. Tentando tirar dos meus ombros a responsabilidade de ser um poeta, envergonhado que sou diante desses pelas minhas pobres rimas ginasianas. Quando por um desses “milagres” de sincronia recebi um e-mail. Nele a amiga, atriz e cantora Thalma de Freitas contava da coincidência que foi receber pela circular do seu grupo de discussão e estudos poéticos, a letra da minha canção “Carne Humana”. Bem... fazer o que né, se minhas letras são objeto de estudo e discussão por amantes da poesia, então me submeto. Eu sou um poeta, desses bem simplórios, mas um poeta.
Foi com esse olhar de quem escreve letra e poesia que me intrometi na canção deles, ajeitando (verso a verso) o sentido, o ritmo e a musicalidade de cada palavra. Modificando a melodia quando necessário e ceifando o supérfluo, até chegarmos a um resultado em comum senso.
Essa linda e tocante canção fala do preço que só cada um sabe que pagou pra chegar aonde está. Das escolhas que fez. Do que precisou abrir mão e do que não prescindiu de modo algum. E de como todo esse investimento pode escorrer pelos dedos se não estivermos alertas, se insistirmos no mau “timing” ou numa percepção errada de propósitos, ocasião e oportunidade. Conclui com um refrão que propõe a possibilidade da transformação através do sacrifício do ego - pois só os estúpidos insistem no erro - e afirma que se essa transformação ocorre com firmeza e vontade, ela certamente será abençoada por todos os anjos e Deuses do firmamento.
E que assim seja:
OS ANJOS DIZEM AMÉM
© 2006 - Yan França, Régis Rodrigues e Guilherme Isnard (BMG Publishing)
Só eu sei o que ficou no caminho
O que não se perdeu
E o que me deixou sozinho
Só eu sei o que passou distante
E o que sempre esteve perto

Talvez não fosse o tempo certo
Ou eu não disse as coisas certas
Não tive um foco definido em mente
Nem estive em alerta permanente

Talvez eu mude, talvez eu me ajude
Talvez eu mude, talvez eu me ajude
Quando a vontade impera amiúde
Os deuses abençoam e os anjos dizem amém

Só eu sei o que ficou no caminho
O que não se perdeu
E o que me deixou sozinho
Só eu sei o que passou distante
E o que sempre esteve perto

Talvez não fosse o tempo certo
Ou eu não disse as coisas certas
Não tive um foco definido em mente
Nem estive em alerta permanente

Talvez eu mude, talvez eu me ajude
Talvez eu mude, talvez eu me ajude
Quando a vontade impera amiúde
Os deuses abençoam e os anjos dizem amém
E os anjos dizem...

E os anjos dizem amém
Talvez eu mude, talvez eu me ajude
Os anjos dizem amém
Talvez eu mude, talvez eu me ajude
Os anjos dizem amém
Dizem amém, dizem amém, dizem amém

quarta-feira, janeiro 18, 2006

RX de uma canção - NEM TÃO LONGE, NEM TÃO PERTO

“Nem Tão Longe, Nem Tão Perto” aconteceu de uma vez na minha cabeça (Clique no título do post para ouvir uma versão ao vivo!).
Mediunicamente falando, eu “ouvi” uma seqüência harmônica e uma melodia e fui andando cantarolando pela praça do Jóquei, até chegar na casa do meu parceiro Fred Nascimento (do Tantra e do Capital Inicial), quando ainda nos encontrávamos rotineiramente para compor, nos idos de 1993. Essa feliz e produtiva parceria rendeu frutos como “Mentiras” do CD “ZERØ Electro Acústico” e “Centúrias” que também estará no “Quinto Elemento”, entre muitos outros.
Voltando a canção, da forma como ela surgiu, hibernou. Ou porque outras canções sempre ganhavam a frente na agenda de trabalho, ou mais provavelmente porque como eu não toco nenhum instrumento harmônico (piano ou violão), ela nunca foi arranjada.
Quando terminamos a primeira fase de gravações, o nosso produtor Nilo Romero estava cismado que tínhamos que fazer alguma regravação, alguma releitura de algum sucesso do passado. Não que eu fosse refratário a idéia, mas eu não tinha nada em mente e não queria gravar uma canção por gravar. Se eu tivesse algum desejo reprimido de cantar essa ou aquela canção seria mais fácil, se existisse uma música que eu sempre sonhara gravar seria tranqüilo, mas o problema seria começar naquele momento a pesquisar um remake. Eu até tentei e numa dessas audições de coisas antigas com o Yan França eu lembrei da música esquecida. Cantarolei um trecho e pedi pra ele me ajudar com uma base harmônica. Pronto! Encontramos nossa nova canção.
Abre parênteses e lava a roupa – O Yan posteriormente, por conta de ter me ajudado a arranjar a música, reivindicou sua participação autoral. Tecnicamente uma canção é dividida entre melodia e letra, ambas minhas. A harmonia que foi a colaboração inestimável do amigo, parceiro e guitarrista é considerada arranjo e arranjo não é autoria, porque uma mesma canção pode ter dezenas de arranjos e harmonias diferentes dependendo de quem a interpreta. Eu normalmente não faço questão dessas tecnicidades, não sou muquirana com parcerias, mas essa música passou os últimos doze anos zumbindo na minha cabeça, acho que foi um justo egoísmo. Além do que, como vocês verão, o Yan tem várias lindas composições no “Quinto Elemento”. – Roupa limpa, fecha parênteses!
Mostramos “Nem Tão Longe, Nem Tão Perto” com o título provisório de “Tapete Voador” e com a letra ainda cheia de mofo pro produtor e ele adorou. Daí eu arregacei as mangas e comecei a espanar tudo o que sobrava ou soava mal até chegar na versão final, mas o Nilo implicou com uns versos depois da música gravada.
“Como só eu sei fazer
No sorriso em seu olhar
Só Narciso pode ver
Quanto eu amo te encontrar"
Esse primeiro, coitado, foi totalmente defenestrado do arranjo, o trecho da melodia que o continha calou, mas eu gostava do jogo de espelhos sugerido pela figura de Narciso e da imagem poética de um olhar que sorri. Já era!
"Te cuidar e proteger
Colorir sua manhã
Ver o dia anoitecer
Dar um beijo de Rodin”
Esse ficou, mas foi modificado. De nada adiantaram meus protestos e argumentações, fui instado a reescrever e regravar a voz, mas como sempre, o atento produtor tinha razão. “Beijo de Rodin” além da confusa cognição auditiva (grafa-se Rodin, mas pronuncia-se Rodam), é uma imagem elitista. Não é todo mundo que conhece a escultura, quando muito lembram de “O Pensador” que é mais pop. Mesmo conhecendo o “O Beijo” talvez tivessem dificuldade em entender uma referência implícita ao beijo de amparo, conforto, segurança e entrega apaixonada, explícitos na imagem.
Não me entendam mal, isso não é subestimar a percepção dos nossos fãs, é a procura da perfeição da expressão, que nesse caso foi a conclusão de que “beijo de hortelã” embora aparentemente oco de sentidos ocultos era uma boa opção poética para representar o frescor desejado, e assim ficou. Eu disse “aparentemente” porque se você notar que é uma citação de “Cotidiano” do Chico Buarque, quando ele diz:
"Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã"
Vai perceber que muito sobre o amparo, conforto, segurança e entrega, estão ali contidos. Leiam/ouçam a canção de Chico, ajuda a entender.
O fato é que com essa ligeira adaptação na letra, boas idéias para um riff de baixo em overdub e um ritmo acelerado imposto pela bateria de Vitor Vidaut, “Nem Tão Longe, Nem Tão Perto” disparou na preferência da banda e do produtor, que a considera a mais “direta” das novas canções.
Essa é uma letra que fala da certeza de que todos nós temos uma alma gêmea, uma cara metade, um porto seguro em algum lugar do tempo/espaço. Aponta que é necessário evoluirmos com foco e objetivo na direção desse encontro e aposta que o outro provavelmente também está procurando quem receba e mereça o seu amor. Venha de onde vier. De um passado de fantasia romântica representado por um tapete voador, ou de disco-voador em um futuro próximo, o que importa é a certeza da sua chegada. Assim como diz a canção:
NEM TÃO LONGE, NEM TÃO PERTO
© 2006 - Guilherme Isnard (BMG Publishing)

Se um dia eu chegar
No lugar que eu quero
Não preciso lembrar
Que é lá que eu te espero

E você vem
Num tapete voador
Procurando por alguém
Que aceite o seu amor
Que mereça o seu afeto

Nem tão tosco, nem tão certo
Nem tão raro, nem deserto
Nem tão longe, nem tão perto
Como só eu sei fazer
Só eu sei fazer

Se você duvidar
Meu afeto é sincero
Pode o tempo passar
Que eu não desespero

E você vem
No seu disco voador
Procurando por alguém
Que aceite o seu amor
Que mereça o seu afeto

Nem tão tosco, nem tão certo
Nem tão raro, nem deserto
Nem tão longe, nem tão perto
Como só eu sei fazer

Dar um beijo de hortelã
Te cuidar e proteger
Colorir sua manhã

Nem tão tosco, nem tão certo
Nem tão raro, nem deserto
Nem tão longe, nem tão perto
Nem tão tosco, nem tão certo
Nem tão raro, nem deserto
Como só eu sei fazer

terça-feira, janeiro 17, 2006

RX de uma canção - A CULPA NÃO É DO AMOR

Vou iniciar o meu exercício de strip-tease autoral com “A Culpa Não É Do Amor” (Clique no título do post para ouvir uma versão ao vivo!) uma das prováveis faixas de trabalho do nosso novo CD “Quinto Elemento”.
Essa canção tem uma bela história. É a primeira composição a unir dois amigos de tantos anos em uma parceria que já tardava. Quem acompanha esse blog deve lembrar que eu fiquei tão feliz e entusiasmado na época em que ela ficou pronta que postei o elogio ao fato e a letra da canção quase imediatamente, mas apaguei em seguida por questões autorais (a música ainda não fora editada).
Jorge Pescara chegou no ZERØ em 1999 de forma inusitada, mas não inusual, foi indicado por um outro músico, que em sua meteórica passagem pela banda trouxe esse baixista - fã incondicional do ZERØ - pra nova formação e pro meu círculo de amizades. Faz sete anos que estamos juntos nesse time, um fiel e leal escudeiro. Um presente dourado e duradouro, valeu Manny!
Várias bolas na trave e gols depois, ele me aparece em um dia de ensaio com a idéia que originou essa pérola. Imaginem a situação: o cara ali, participando o tempo todo dos arranjos, dando palpites estéticos e melódicos (em uma banda de verdade a canção só está pronta depois de escrutinada, lapidada e arranjada em cada um dos seus detalhes e essa é uma atividade do conjunto, democrática - well ok... relativamente democrática), sendo uma peça fundamental no processo criativo, mas ainda sem ter gerado um filho próprio, só ajudando a vestir, pentear e perfumar filhotes alheios - e isso não é pouca coisa não.
Quando Pescara apresentou a linha de baixo da sua composição (foi assim que ela surgiu, acompanhada de uma bela progressão harmônica pra guitarra do Yan, que infelizmente sumiu na versão final da música), eu senti a responsabilidade de encontrar palavras de profundo sentido e uma melodia especial praquela canção.
A letra nasceu fácil e naturalmente, acompanhando meu balbucio melódico já na primeira tentativa estrutural. Eu escolhi como tema a antítese da letra de “Eu Matei o Amor” do meu irmão Marcelo “Uns & Outros” Hayena que ouvira na noite anterior. A tese dele é: morto o amor, não existe mais a dor e o sofrimento. E criou um vingador, assassino do amor, para a redenção dos corações partidos.
Eu adorei a canção, mas não consegui aceitar o mote e escrevi “A Culpa Não É Do Amor” porque ninguém é obrigado a sofrer. Você e o seu livre arbítrio é que determinam se vai aprender a lição pela dor ou pelo amor, mas a maioria dos humanos escolhe o aprendizado pela dor, talvez porque através dela as lições sejam mais profundas e duradouras, vai saber. A minha luta é a do aprendizado amoroso e é isso que legitima e fundamenta essa canção.
Não é a primeira nem a última vez que eu digo aqui e alhures que só consigo cantar verdades, portanto as minhas letras contém muitos elementos auto-biográficos. Em “A Culpa Não É Do Amor” eu narro as minhas visões do caminho pela “longa” estrada da vida e os ciclos que por vezes nos aprisionam. Concluo com um refrão que explica que o amor é um portal, mas é você quem escolhe trilhar esse caminho ou construir sua própria armadilha.
Essa canção, como suas irmãs do CD “Quinto Elemento”, recebeu o “toque” do genial camarada e produtor Nilo Romero. Sua astuta e afiada tesoura capou não só a progressão harmônica da guitarra (objetivando, com sucesso, realçar o pulso rítmico - a função da guitarra aqui, com exceção de alguns riffs melódicos e do solo, é essencialmente percussiva), como amputou com propriedade e precisão cirúrgica alguns dos meus versos inteiros. O principal deles dizia hermeticamente:
“O medo é o antônimo
Não o ódio que eu pensava
Ser nêmesis sincrônico
De tudo o que eu amava”
Porque eu sentia necessidade de explicar que o ANTÔNIMO do AMOR é o MEDO e NÃO o ÓDIO como quase todos pensam. O ódio é só uma extremidade polar do mesmo sentimento, o amor em sua máxima expressão negativa. O Medo e a Culpa (sua forma sofisticada), é que são opostos ao amor. Pressupõe a falta de fé e a descrença no amor incondicional quando Deus só se manifesta no imponderável. Isso dá lugar a uma sensação de abandono e solidão existencial que nos paralisa impedindo ou retardando o desenvolvimento. Sim eu sei, estamos todos sós, mas não por estarmos separados, estamos todos sós por não aceitarmos sermos o mesmo, sermos um.
E qual o catalisador desse amálgama? O “Quinto Elemento”. O amor incondicional em sua forma pura. Olhar para o outro e não enxergar suas qualidades e “outros” defeitos e sim seus próprios defeitos e qualidades, reconhecê-los e apropriá-los. Julgar suas ações e não as alheias, ou melhor, NÃO JULGAR! Essa é uma atribuição divina em um plano muito mais elevado.
É muita informação pras quatro linhas de um verso, é esperar demais do poder de uma canção da qual as pessoas, como bem observou Ira Gershwin, no máximo vão lembrar do refrão. Então chega de papo e vamos a ela:
A CULPA NÃO É DO AMOR
© 2006 - Jorge Pescara & Guilherme Isnard (BMG Publishing)

Ao longo do caminho
Passam cenas que eu já vi
Nas pessoas repetidas
Nas histórias que eu ouvi

Mas não sou prisioneiro
Condenado ao déjà vu
Eu me lanço ao mundo inteiro
Com a mente e o corpo nu

Alegria é quem me ensina
Ironia é mau humor
Não se aprende só sofrendo
Não é necessária a dor

Eu só sei que eu não sei de nada
Mas a culpa não é do amor
Ele é só a porta de entrada
Pra onde você for

Eu só sei que eu não sei de nada
Mas a culpa não é do amor
Ele é só a porta de entrada
A culpa não é do amor

Viva o belo nos momentos
Não se apegue ao que passou
Plante nobres sentimentos
E colha os frutos que plantou

Eu só sei que eu não sei de nada
Mas a culpa não é do amor
Ele é só a porta de entrada
Pra onde você for

Eu só sei que eu não sei de nada
Mas a culpa não é do amor
Ele é só a porta de entrada
A culpa não é do amor

Não é do Amor
Não é do amor
Não é do amor
A culpa não é do amor

segunda-feira, janeiro 16, 2006

QUINTO ELEMENTO - ZERØ 2006 - A CAPA!

Todo mundo a essa altura já sabe que "Quinto Elemento" é o nosso novo CD, mas ninguém ainda tinha visto a capa, ilustração e projeto gráfico bacanérrimo do designer Eduardo (Dudu) Rocha. Ta aí!

A idéia era a de circunscrever com um Oroboros (a serpente ou dragão que engole a própria cauda, o símbolo mais antigo da humanidade, representação do cosmos, do infinito, do continuum) uma rosa dos ventos que apontasse além dos pontos cardinais, os elementos. Apresentando o amor como o quinto deles e também como uma quinta direção.

O artista chegou nessa belíssima ilustração rica de detalhes e referências. Prato cheio pra quem, como eu, adora descobrir sentidos ocultos e mensagens cifradas. Até uma citação ao "Poema de Sete Faces" de Carlos Drummond de Andrade em latim está presente.

Durante essa semana eu prometo detalhes das gravações e das novas canções. Apareçam e comentem.

quarta-feira, janeiro 04, 2006

ILAÇÕES SOBRE A AMIZADE

Esse é o primeiro post de 2006, me parece apropriado discorrer sobre um tema que foi muito importante e determinante pra mim durante todo o ano de 2005, a amizade.

Foi a amizade que me proporcionou os melhores e piores momentos de 2005, mas acima de tudo, foi ela a mestra das melhores lições.

Sei bem que sou um escriba inconstante e é possível que essa descontinuidade desaponte os que nos visitam interessados nessa leitura. A razão é simples, escrever e compor dependem da necessidade de externar algo, fazer uma declaração pro mundo, esclarecer algo pra mim mesmo ou pro outro. Não consigo escrever textos ou canções vazias nem escrever por escrever. Desculpem-me.

Já até tentei transformar esse blog num diário, mas qual a finalidade de um diário? A satisfação da curiosidade alheia? A fixação de eventos passados numa memória "física"? De curiosos e lembranças permanentes eu estou bem obrigado.
Esgotado o preâmbulo, cometo algumas divagações sobre esse tipo especial de (pra variar) amor.


Afinal, o que é esse estranho e poderoso elo capaz de unir pessoas por uma existência e além dela? Através de vales e montanhas, dores e risos, guerras e paz? Como nasce uma amizade? No que consiste essa mágica?

Não sou teórico, muito menos filósofo, mas me arrisco por algumas linhas e entre elas.

No vernáculo o verbete oferece a definição concreta de um sentimento abstrato. Nos explica e sinonimiza:
Do Lat. *amicitate. Substantivo feminino. 1.afeição, 2.amor, 3.boas relações, 4.laço cordial entre duas ou mais entidades, 5.dedicação, 6.benevolência.

Soa justo e preciso, afeição + amor + dedicação + benevolência = amizade. É uma bela equação certo? Errado! Eis porque: a amizade presume a doação e esse é o fator ausente na “formulação" proposta. Por doação subentende-se que quem recebe aceita o que é oferecido. Mas não, não é simples assim, temos nossas exigências, muito se cobra de um amigo hoje em dia.

Não sei como funcionava no passado, mas vivo a fantasia romântica de que a amizade é um afeto desinteressado, do qual não se espera nada além da recompensa intrínseca de saber-se caro, estimado, único, insubstituível e (por extensão) confiável, leal e pertencente (no sentido de não-só). Hoje sou obrigado a aceitar com tristeza que não é o bastante.

É certo que amizade é um bem, mas não é commodities, não é uma ação que rende dividendos, ou não deveria ser. Atualmente as pessoas determinam o que elas querem/devem receber em troca de uma amizade, como se a contabilidade desse afeto fosse administrável. E ai daqueles que falharem no balancete, serão extirpados friamente do calorzinho bom de um abraço fraterno e condenados ao limbo da incredibilidade e da falência cordial.

“Em troca da amizade” como assim?
Pois se amizade é doação, o que se dá em troca da coisa doada? O prazer de se dar ou de dar algo, não é um pressuposto de incondicionalidade?
Ahhhh não! Doce ilusão, levado pelo entusiasmo da fluência do desabafo me engano redondamente, doação não faz parte dos sinônimos tecnicamente aplicáveis à amizade. Mas deveria! Alguém concorda?

Um amigo não é o fruto de uma elucubração nem de uma decisão racional, tampouco de um sorteio. O amigo não se escolhe, acolhe-se. É destino, não opção. É a família eleita, o irmão, o filho ou o pai por adoção. Pode estar próximo ou ausente. Na virtualidade ou no mundo real. É aquele por quem nos batemos e com quem contamos nos momentos importantes, nas grandes crises e junto a quem festejamos as conquistas verdadeiras. O amigo não é um amante, não é um amor que vai ou vem ao sabor ou saber, não é descartável e, decididamente, não é uma efêmera paixão.

Um amigo permanece, é pra sempre, é eterno.
Que me perdoe Vinicius, mesmo que não dure.

Que vocês façam muitas novas, verdadeiras e duradouras amizades em 2006.

Dois ZERØ ZERØ Meia na Veia!

Amigos,

Nos despedimos de mais um ano com seus bons e maus momentos enquanto outro, novinho em folha, principia.

Vamos trazer pra esse as boas lembranças e o aprendizado das más e cuidar para que as boas se multipliquem e as outras não se repitam.

Um ano novo é o palco ideal pra gente estrelar em grande estilo o espetáculo que passamos um ano inteirinho ensaiando: nosso NOVO EU.

Muita merda na sua estréia!

Felix 2006!
foto - Bob Boorhem